A relação de muitas crianças e jovens com a escola nem sempre é fácil.
Para alguns, aprender é um processo desafiante marcado por frustração, desânimo e um sentimento persistente de insucesso. Estes desafios afetam não só o desempenho escolar mas também a autoestima do aluno e a dinâmica familiar. 😞
É de salientar que, nem sempre os maus resultados escolares resultam da falta de esforço ou interesse. Muitas vezes, a origem está em dificuldades específicas relacionadas com a forma como o cérebro processa a informação e que comprometem a consolidação de conhecimentos. 📖🧠
Neste artigo, aprofundamos o conceito de aprendizagem e explicamos o que são Perturbações de Aprendizagem Específica - como se manifestam, como é feito o seu diagnóstico e quais as estratégias de intervenção mais eficazes.
Certamente que, em algum momento da sua vida como aluno, ouviu que “aprender é mais do que decorar a matéria” e de facto, é verdade! ✅
A aprendizagem é um processo dinâmico e contínuo onde são adquiridos conhecimentos, competências e valores que interferem diretamente nos comportamentos, decisões e na perceção do mundo ao redor.
Este processo envolve várias funções cognitivas como a atenção, a perceção, a memória, a linguagem e o raciocínio lógico que implica o funcionamento de diferentes regiões do cérebro.
Não é novidade que cada pessoa aprende de forma diferente, o que é perfeitamente natural e que torna o processo, do ponto de vista educativo, mais desafiante.
Existem, por isso, diferentes tipos de aprendizagem com os quais cada pessoa pode ter uma maior ou menor preferência/afinidade:
🔸Aprendizagem visual: A informação é retida mais facilmente através de imagens, vídeos, esquemas ou mapas.
🔸Aprendizagem auditiva: A compreensão é favorecida através da escuta de explicações, debates ou gravações.
🔸Aprendizagem cinestésica (ou tátil): O chamado “aprender com a experiência". Privilegia a aprendizagem através da ação, movimento e do contacto.
🔸Aprendizagem significativa: Quando um novo conhecimento se relaciona com algo que o aluno já conhece, tornando-se facilmente compreensível e duradouro.
🔸Aprendizagem mecânica: Baseada na repetição e na memória.
🔸Aprendizagem social: Baseada na observação e interação com outras pessoas.
Como já tivemos oportunidade de abordar no artigo “Curiosidades sobre o Cérebro Humano”, a aprendizagem depende de três elementos fundamentais:
1️⃣ Atenção: Para captar e interpretar a informação.
2️⃣ Memória: Para guardar informação e “recuperá-la” mais tarde.
3️⃣ Repetição: Para consolidar conhecimentos e transformá-los em memórias de longa duração.
Assim, independentemente do tipo de aprendizagem, só com estes 3 fatores é possível reter conhecimentos de forma eficaz e duradoura.
👉As Perturbações de Aprendizagem Específicas têm origem neurobiológica, sendo o resultado da combinação de fatores genéticos e ambientais, afetando a eficiência do cérebro na percepção e processamento de informações.
Estas perturbações denominam-se de acordo com o(s) tipo(s) de dificuldade(s) apresentada(s) pela criança ou jovem, desde a leitura, à escrita e/ou no cálculo.
Assim, crianças e jovens com estas perturbações tendem a revelar baixa autoestima, ansiedade e pouca persistência face a atividades de foro escolar. Isto pode culminar em comportamentos de resistência ou mesmo desistência em tarefas que os confrontam com as dificuldades.
No entanto, deve-se ter em conta que estas crianças e jovens não diferem dos seus colegas no que diz respeito ao desejo de estudar e aprender. Têm necessidades de aprendizagem diferentes e, por isso, precisam de estratégias adaptadas.
As Perturbações de Aprendizagem Específicas não estão relacionadas com o nível de inteligência, fatores emocionais ou oportunidades educativas. Estão sim relacionadas com alterações na forma como o cérebro processa determinadas informações. Eis as principais:
A dislexia é mais do que uma dificuldade na leitura. É uma perturbação que afeta a capacidade da pessoa de reconhecer e processar a linguagem escrita.
Trata-se de dificuldades específicas persistentes: no reconhecimento de palavras, na descodificação, na fluência da leitura, em soletrar e nos processos ortográficos, sendo frequentemente acompanhada por sentimentos de frustração em ambientes académicos e profissionais.
A dislexia pode ser distinguida em três tipos:
🔹Dislexia Fonológica: Dificuldade na decodificação de palavras novas e pseudopalavras (combinações de letras sem significado real usadas em testes para avaliar a habilidade fonológica na leitura).
🔹Dislexia de Superfície: Dificuldade em reconhecer palavras familiares à primeira vista (memória visual das palavras).
🔹Dislexia Mista: combinação das duas anteriores.
➡️ Dificuldade na decodificação de palavras e na compreensão.
➡️ Leitura lenta e imprecisa.
➡️ Problemas persistentes com a soletração e a consciência fonológica, que é a dificuldade em reconhecer e manipular os sons da fala.
➡️ Erros ortográficos frequentes.
➡️ Dificuldade em expressar pensamentos por escrito e organizar o trabalho escrito.
➡️ Dificuldades em seguir uma sequência de instruções ou eventos.
➡️ Demorar mais tempo do que o esperado para concluir tarefas de leitura e escrita.
➡️ Desafios na pronúncia precisa de palavras.
➡️ Falta de motivação para estudar, tristeza, frustração, ansiedade, irritabilidade.
➡️ Baixa autoestima.
Tanto a Disortografia e Disgrafia envolvem dificuldades com a componente escrita.
A Disortografia é uma perturbação de aprendizagem que afeta a escrita correta das palavras e verifica-se mesmo quando a criança apresenta um bom desempenho na leitura e no raciocínio.
Já a Disgrafia afeta a legibilidade da escrita, a sua fluidez e a organização do texto.
➡️ Múltiplos erros ortográficos, gramaticais e/ou de pontuação.
➡️ Expressão escrita desorganizada e pouco clara.
➡️ Percepção da escrita como algo extremamente desafiante e desmotivador.
➡️ Dificuldades na motricidade fina, associada ao grafismo e à pega do material de escrita e de recorte.
Como vimos, apesar de a Disortografia e a Disgrafia se inserirem nos prejuízos de escrita, são perturbações distintas. No processo de avaliação e diagnóstico é fundamental identificar se as dificuldades da criança residem na ortografia; e/ou na gramática e pontuação; e/ou na clareza e organização da expressão escrita. Esta distinção permite uma intervenção mais adequada às necessidades da criança ou jovem.
A Discalculia é uma perturbação que interfere com a capacidade de compreender e trabalhar com números e operações matemáticas.
➡️ Dificuldades no domínio do sentido dos números.
➡️ Limitações no cálculo mental simples.
➡️ Obstáculos em converter o pensamento em discurso.
➡️ Falha na aplicação de factos numéricos e de cálculo
➡️ Dificuldade com o raciocínio matemático.
➡️ Contar pelos dedos e perder-se no cálculo
➡️ Manifestação de tonturas e dores de cabeça durante a leitura.
O diagnóstico de uma Perturbação de Aprendizagem Específica é um processo cuidadoso que implica uma avaliação completa, complexa e delicada que considera: o histórico médico, familiar e educacional, bem como avaliações escolares e psicopedagógicas da criança ou jovem. 🔍🎯
Tendencialmente, o diagnóstico é feito dois anos após o início da aprendizagem da leitura e da escrita visto que muitos erros fazem parte do processo. No entanto, sinais de alerta precoces podem e devem ser valorizados, pois permitem implementar estratégias reeducativas precoces - fundamentais para minimizar o impacto das dificuldades e promover o sucesso escolar e emocional da criança.
Durante a avaliação, é essencial perceber se as dificuldades são persistentes ou se se devem apenas a um ritmo de aprendizagem mais lento, muitas vezes corrigido com o tempo, o treino e o próprio amadurecimento neurológico.
Na NeuroImprove, é realizada uma avaliação neuropsicológica que avalia a presença e a severidade das dificuldades de aprendizagem. Além disso, é analisado um Eletroencefalograma Quantitativo (qEEG) que ajuda a identificar padrões cerebrais associados às dificuldades.
Com os resultados obtidos, é elaborado um plano de intervenção personalizado e focado nas necessidades e capacidades de cada criança/jovem.
👉 A intervenção da NeuroImprove distingue-se pela sua abordagem rigorosa e integrada, orientada para os desafios e obstáculos em todos os domínios e contextos de vida.
Uma das ferramentas utilizadas é a terapia de Neurofeedback, uma técnica de treino cerebral que:
Como resultado e com o tempo, observa-se uma melhoria do desempenho que promove a autoestima da pessoa.
Paralelamente, a nossa clínica também propõe sessões de Psicologia Clínica que permitem a reeducação das áreas em dificuldade e a promoção do equilíbrio emocional.
O objetivo final é a melhoria acentuada das dificuldades nas esferas escolar, social e familiar. 😊
Um artigo redigido por Anthony et al. afirma que as Perturbações Específicas de Aprendizagem ocorrem frequentemente e simultaneamente com outros transtornos de neurodesenvolvimento como o Autismo ou a PHDA (Perturbação de Hiperatividade e Défice de Atenção).
✏️ Crianças com PHDA tendem a ter mais dificuldades em manter a atenção, seguir instruções e organizar o pensamento, o que agrava os desafios da aprendizagem.
Assim, é fundamental identificar corretamente ambas as condições para garantir uma intervenção eficaz e diferenciada.
👉 As Perturbações de Aprendizagem Específicas são desafios reais que podem impactar profundamente crianças e jovens em diferentes níveis (autoestima, motivação e percurso escolar).
No entanto, com o apoio certo, é possível contornar estas barreiras e promover uma redução dessas dificuldades promovendo a autonomia, autoconfiança e sucesso educativo.
Todos aprendemos de forma diferente e temos níveis de dificuldade também diferentes, e está tudo bem. Com motivação, paciência e o apoio certo, podem ser encontradas estratégias que ajudam no processo educativo - respeitando o ritmo, o estilo e talentos individuais. 💙
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